A Doutrina da Imortalidade Condicional Segundo a IASD
A Doutrina da Imortalidade Condicional Segundo a IASD
Introdução
A doutrina da imortalidade condicional ensina que a imortalidade não é inerente ao ser humano, mas um dom concedido por Deus apenas aos justos na ressurreição final. Essa crença se opõe à ideia da imortalidade natural da alma, predominante no Cristianismo ao longo dos séculos. A Igreja Adventista do Sétimo Dia (IASD) adota essa visão como uma de suas crenças fundamentais, baseada em uma interpretação da Bíblia que enfatiza a mortalidade da alma e a necessidade da ressurreição para a vida eterna. Este estudo examina as bases bíblicas, históricas e teológicas dessa doutrina, abordando como ela se consolidou na IASD e considerando perspectivas de teólogos adventistas e não adventistas.
---
Fundamentos Bíblicos da Imortalidade Condicional
A base da imortalidade condicional repousa na ideia de que somente Deus possui imortalidade inerente (1Tm 6:16). A Escritura ensina que os seres humanos são mortais e que a morte é um estado de inconsciência até a ressurreição. Alguns dos principais textos que fundamentam essa crença incluem:
1. A criação do ser humano – Em Gênesis 2:7, Deus forma o homem do pó e sopra nele o fôlego de vida. O texto não sugere que Adão possuía uma alma imortal, mas que a vida dependia desse sopro divino.
2. A advertência divina sobre a morte – Deus advertiu Adão e Eva de que a desobediência resultaria em morte (Gn 2:17). A serpente contradisse isso, sugerindo que eles "certamente não morreriam" (Gn 3:4), o que pode ser interpretado como a primeira mentira sobre a imortalidade da alma.
3. O ensino de Eclesiastes – Salomão afirma que "os mortos não sabem coisa nenhuma" (Ec 9:5) e que "no Sheol, para onde tu vais, não há obra, nem projeto, nem conhecimento, nem sabedoria" (Ec 9:10), reforçando a ideia de inconsciência na morte.
4. O ensino de Jesus – Em João 11, Jesus chama a morte de "sono" quando se refere a Lázaro (Jo 11:11-14). Se Lázaro tivesse uma alma imortal que continuasse consciente após a morte, não faria sentido chamá-lo de "adormecido".
5. O ensino de Paulo – O apóstolo ensina que a ressurreição é a única esperança para os crentes: "Se Cristo não ressuscitou, é vã a nossa fé, e ainda estamos em nossos pecados" (1Co 15:17). Ele também menciona que a "imortalidade" será revestida somente na ressurreição (1Co 15:51-54).
6. O destino final dos ímpios – Em Mateus 10:28, Jesus ensina que Deus pode destruir "tanto a alma como o corpo no inferno", sugerindo que os ímpios não sofrerão tormento eterno, mas serão aniquilados.
---
A Influência da Imortalidade da Alma na Tradição Cristã
Embora o Antigo Testamento e o Novo Testamento apontem para a imortalidade condicional, a crença na imortalidade da alma tornou-se dominante no Cristianismo primitivo sob a influência do pensamento grego, especialmente de Platão. Para Platão, a alma era imortal por natureza e continuava sua existência após a morte. Essa visão foi incorporada ao Cristianismo através de influências filosóficas neoplatônicas e desenvolvida por teólogos como Agostinho de Hipona.
Agostinho argumentou que a alma era imortal por natureza e que o inferno seria um estado eterno de tormento para os ímpios. Essa ideia foi consolidada na teologia medieval e reforçada pelo pensamento escolástico, tornando-se a visão predominante na Igreja Católica e posteriormente no Protestantismo tradicional.
No entanto, ao longo da história, houve cristãos que rejeitaram essa perspectiva. Os anabatistas, os socinianos e alguns grupos reformadores questionaram a imortalidade da alma e defenderam a visão do "sono da alma" e da aniquilação dos ímpios.
---
A Introdução da Imortalidade Condicional na Igreja Adventista
A crença na imortalidade condicional adentrou a Igreja Adventista do Sétimo Dia através do movimento milerita e do estudo das Escrituras realizado por seus primeiros líderes. William Miller, embora não tenha desenvolvido uma teologia detalhada sobre a morte, influenciou um grupo de estudiosos bíblicos que passaram a rejeitar a imortalidade inata da alma.
Joseph Bates, um dos pioneiros adventistas, começou a estudar a questão da imortalidade condicional na década de 1840. No entanto, foi através do trabalho de George Storrs e James White que a doutrina se consolidou na IASD. Storrs, influenciado pelos escritos de Henry Grew, argumentava que a Bíblia ensina que a alma é mortal e que os ímpios serão destruídos no juízo final.
Ellen G. White, uma das figuras centrais do adventismo, apoiou a imortalidade condicional e escreveu extensivamente sobre o tema. Em seu livro O Grande Conflito, ela descreve a destruição final dos ímpios como um ato de justiça divina, e não como um sofrimento eterno.
Ao longo do século XIX, a doutrina foi refinada e se tornou uma das 28 Crenças Fundamentais da IASD. O Manual da Igreja Adventista e outras publicações oficiais reforçam essa posição como essencial para a teologia adventista.
---
Teólogos Adventistas e Não Adventistas Sobre o Tema
Vários teólogos adventistas defenderam e aprofundaram essa doutrina ao longo dos anos:
LeRoy Edwin Froom – Em sua obra The Conditionalist Faith of Our Fathers, ele traça a história da crença na imortalidade condicional desde a Igreja Primitiva até os adventistas.
Samuele Bacchiocchi – Em Immortality or Resurrection?, ele argumenta que a crença na alma imortal é uma influência pagã e que a Bíblia ensina a ressurreição como a única esperança para os mortos.
John Stott (anglicano) – Embora não adventista, Stott também questionou a imortalidade inata da alma e sugeriu que a aniquilação dos ímpios faz mais sentido teologicamente do que o inferno eterno.
Edward Fudge – Em seu livro The Fire That Consumes, Fudge apresenta uma defesa detalhada do aniquilacionismo, argumentando que a Bíblia ensina a destruição total dos ímpios, e não seu sofrimento eterno.
Esses e outros teólogos reforçam a visão adventista de que a imortalidade é um dom de Deus e não uma qualidade inerente ao ser humano.
---
Conclusão
A doutrina da imortalidade condicional, ensinada pela IASD, fundamenta-se na Bíblia e tem raízes históricas em uma tradição que remonta aos primeiros cristãos. Diferente da crença predominante na imortalidade da alma, essa visão argumenta que somente Deus possui imortalidade inerente e que os seres humanos só a recebem na ressurreição.
Embora tenha sido rejeitada por grande parte do Cristianismo histórico, a imortalidade condicional tem ganhado reconhecimento entre estudiosos de diversas tradições. Ao enfatizar a justiça divina e a esperança na ressurreição, essa doutrina fornece uma alternativa teológica coerente à visão tradicional do inferno eterno.
A Igreja Adventista do Sétimo Dia continua a sustentar essa crença como parte essencial de sua teologia escatológica, destacando a importância da volta de Cristo e da ressurreição dos justos como a verdadeira esperança da imortalidade.
Comentários
Postar um comentário